Dados do Fórum Brasileiro de Segurança PĂșblica divulgados na terça-feira (28), apontam que das 30 cidades com mais mortes violentas no paĂs, cinco estão na Bahia. Destas cincos, Wenceslau Guimarães estĂĄ na lista com registro de 64 mortes entre 2019 e 2021.
Todos os municĂpios estão localizados na região sul do estado e representam 16,7% das localidades com mais mortes violentas do Brasil entre os anos de 2019 e 2021. O estado tem a maior taxa de mortes violentas do paĂs.
Para rankear as cidades, o AnuĂĄrio Brasileiro de Segurança PĂșblica analisou a taxa de mortes violentas a cada 100 mil habitantes. As cidades da Bahia e suas respectivas taxas são: Aurelino Leal (144,2), Jussari (120,9), Itaju do Colônia (111), Wenceslau Guimarães (103,3) e Santa Cruz CabrĂĄlia (102,6).
A categoria de mortes violentas diz respeito à soma de vĂtimas de homicĂdio doloso, latrocĂnio, lesão corporal seguida de morte e mortes decorrentes de intervenções policiais em serviço ou fora. A Bahia como um todo registrou 44,9 mortes a cada 100 mil habitantes em 2021 - o que representa um aumento de 0,1 pontos percentuais em relação ao ano anterior. É a maior taxa para o estado desde de 2017, quando foram 45,5 vĂtimas a cada 100 mil pessoas. A capital baiana, segundo o levantamento, é a segunda que mais registrou mortes violentas em 2021, com taxa de 55,6.
Fora do radar
Das cinco cidades que aparecem na lista do AnuĂĄrio, trĂȘs estão localizadas em zonas rurais: Jussari, Itaju do Colônia e Wenceslau Guimarães. Por serem zonas de acesso mais difĂcil, os combates acontecem de modo distinto. Iago Alves, residente de Aurelino Leal cita os facões como objeto comum durante crimes na região.
Outra caracterĂstica é a fuga por matagais, conhecendo a região, criminosos conseguem se esconder na mata durante dias para despistar a polĂcia, afirmam moradores. Em setembro do ano passado, duas pessoas morreram e trĂȘs ficaram feridas em um assalto a uma fazenda em Santa Cruz CabrĂĄlia. Um trio armado invadiu a propriedade e rendeu as sete pessoas que estavam no local. Na ocasião, Antônio Eler Gomes, de 62 anos, foi morto com vĂĄrios tiros pelos ladrões.
Em março deste ano, uma mulher identificada como Rayssa Santana matou o filho de 1 ano e 4 meses asfixiado no distrito de Cocão, na zona rural de Wenceslau Guimarães. Após o crime, ela se matou. Antes de matar o bebĂȘ, a mulher ainda gravou um vĂdeo de despedida com a criança no colo.
Enquanto nĂșmero de homicĂdios diminui no Brasil, Bahia registra aumento
O registro de ocorrĂȘncias de homicĂdios dolosos, quando hĂĄ morte intencional, teve aumento de 2% entre 2020 e 2021 na Bahia, de acordo com o AnuĂĄrio Brasileiro de Segurança PĂșblica. Enquanto que no primeiro ano foram 5.087 ocorrĂȘncias e 5.360 vĂtimas, no ano passado os nĂșmeros saltaram para 5.206 homicĂdios com 5.532 mortes.
O cenĂĄrio do estado vai na contramão do que acontece nacionalmente. No mesmo perĂodo analisado, houve redução de 6,8% no nĂșmero de ocorrĂȘncias de homicĂdios no paĂs e diminuição de 6,6% no total de vĂtimas. PolĂticas pĂșblicas eficientes em outros estados justificam a diminuição do Ăndice no contexto nacional, segundo especialistas ouvidos pela reportagem.
Além da Bahia, outros seis estados também registraram incremento no nĂșmero de ocorrĂȘncias, são eles: Amazonas (48,3%), AmapĂĄ (28%), Roraima (12,8%), PiauĂ (11,4%), Rondônia (7,8%) e Mato Grosso do Sul (0,8%). O estado que mais reduziu o nĂșmero de homicĂdios foi o Acre (-39,6%).
Bahia ocupa o quinto lugar em mortes por policiais
Na lista que possui todos os estados e o Distrito Federal, a Bahia figura em quinto lugar no ranking de letalidade em decorrĂȘncia de ações policiais em 2021. A taxa de pessoas mortas é de 6,7 a cada 100 mil habitantes, mais do que o dobro da média nacional, que é de 2,9. Em nĂșmeros absolutos, o estado só perde para o Rio Grande do Norte.
Somente no ano passado, 1.010 pessoas morreram na Bahia por conta de ações das polĂcias Civil e Militar. Apesar do nĂșmero ser alto, representa uma redução de 11,2% em comparação com o total de vĂtimas em 2020. Naquele ano, operações das forças militares mataram 1.138 pessoas no estado.
Para Luciene Santana, pesquisadora da Rede de Observatórios da Segurança e da Iniciativa Negra na Bahia, a letalidade policial é um reflexo da ineficiĂȘncia da polĂtica de segurança que preza pelo confronto. "A polĂtica de segurança pĂșblica da Bahia se espelha na do Rio de Janeiro, que é o pior exemplo do paĂs. Essa forma de fazer segurança reproduz um modelo de guerra que resulta em ainda mais mortes de civis e agentes pĂșblicos", explica.
Desde que o Fórum Brasileiro de Segurança PĂșblica começou a analisar o retrato da violĂȘncia no paĂs, em 2007, o perfil das vĂtimas de intervenções policiais tem se repetido ano após ano. A violĂȘncia policial atinge, na Bahia e no Brasil, homens, jovens e negros de maneira desproporcional. No Ășltimo ano no paĂs, 99,2% dos mortos eram do sexo masculino e 52,4% tinham no mĂĄximo 24 anos.
Em relação à cor da pele, enquanto a mortalidade entre vĂtimas brancas diminuiu 30,9% em 2022, a taxa de vĂtimas negras cresceu em 5,8%.
NĂșmero de latrocĂnios cresce 26% na Bahia
Ainda segundo o levantamento, casos de roubo seguido de morte, conhecidos popularmente como latrocĂnio, tiveram aumento de 26% no estado em 2021, ao comparar com 2020. Foram 137 mortes em nĂșmeros absolutos, 29 casos a mais que no ano anterior.
À vista da diminuição de casos, especialistas na ĂĄrea criminal apontam para a necessidade de polĂticas pĂșblicas em relação a direitos de inclusão social. O objetivo é a diminuição da desigualdade social no paĂs, gerador do alto Ăndice de criminalidade. Para isso, a geração de emprego é citada como meio possĂvel ao Estado, com a finalidade de consolidar a possibilidade de renda para mais cidadãos.
Amazônia tem 13 das 30 cidades com mais mortes violentas
Enquanto a Bahia acumula 5 cidades, a região amazônica soma 13 municĂpios dos 30 com alta taxa de mortes violentas intencionais. O nĂșmero é resultado da quantidade de estados em que o bioma estĂĄ presente. A exemplo de Jacareacanga, no ParĂĄ, cuja taxa é de 199,2 mortes por 100 mil habitantes, sendo o segundo municĂpio mais violento do paĂs.
As cidades que completam a lista são: no ParĂĄ, Floresta do Araguaia (133,0), Cumaru do Norte (113,2), Senador José PorfĂrio (109,8), Anapu (107,1), Novo Progresso (106,1) e Bannach (101,8). Em Rondônia, Santa Luzia D"Oeste (139,0), São Felipe D"Oeste (138,3). No Maranhão, Junco do Maranhão (107,2). Em Mato Grosso, Aripuanã (120,2), Glória D"Oeste (110,8) e no Amazonas, JapurĂĄ (114,0).
As localidades ainda se encontram em proximidade com terras indĂgenas e, assim, espelham a realidade de violĂȘncia, por meio do desmatamento e garimpo ilegal, apontada por ambientalistas e representantes de comunidades autóctones.
O esquema ainda aponta para as mortes do jornalista Dom Phillips e indigenista Bruno Pereira, nos quais os suspeitos do assassinato fazem parte de uma quadrilha de pescadores ilegais em região amazônica.
O que diz a SSP
Em nota, a Secretaria de Segurança PĂșblica do Estado da Bahia (SSP) contestou os dados divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança PĂșblica e informou que a média de mortes dos Ășltimos trĂȘs anos não ultrapassou dois casos mensais. Segundo a SSP, entre o triĂȘnio 2019 e 2021, foram registradas 80 mortes em Santa Cruz CabrĂĄlia, 64 em Wenceslau Guimarães, 33 em Aurelino Leal, 19 em Jussari e 18 em Itaju do Colônia.
A pasta justificou que "considera que o ranking divulgado apresenta uma realidade distorcida, jĂĄ que as cidades analisadas possuem, no mĂĄximo, 27 mil habitantes (Santa Cruz CabrĂĄlia), o que, obviamente, impacta no cĂĄlculo da taxa por 100 mil habitantes". A SSP reforçou que o estado apresentou redução de mortes violentas em 11,4% entre janeiro e maio deste ano.
JĂĄ sobre os dados referentes à letalidade em ações da polĂcia, a SPP diz que "as PolĂcias Civil e Militar são pautadas para atuar dentro da legalidade e do uso proporcional da força. Casos que fujam dessas premissas devem ser denunciados para que as medidas legais sejam adotadas".
A pasta lembra ainda que estĂĄ em processo de anĂĄlise para a aquisição das bodycams, câmeras corporais que serão acopladas aos fardamentos com objetivo de oferecer cada vez mais transparĂȘncia às ações policiais.
A reportagem entrou em contato com a PolĂcia Civil e o Ministério da Justiça e Segurança PĂșblica solicitando posicionamento acerca das taxas de violĂȘncias no interior baiano, mas não recebeu retorno. Assim como requeriu às prefeituras de Aurelino Leal, Jussari, Itaju do Colônia, Wenceslau Guimarães e Santa Cruz CabrĂĄlia as medidas de segurança nas regiões, no entanto, não foi atendida.
(Fonte: Correio 24 Horas)
Reprodução Repórter Bahia