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Professor Pedraum

No limiar da contradição, explica o Professor Pedraum

"Essa contradição fica mais escancarada se analisarmos as redes sociais, onde se nota uma série de pessoas emitindo suas opiniões baseadas muitas vezes em memes ou grupos de WhatsApp, ou até mesmo em algum site de notícias, como se fossem especialistas em assuntos que exigem no mínimo alguns anos de estudos".

No limiar da contradição. Foto Reprodução
No limiar da contradição. Foto Reprodução

Tenho percebido que nós, seres humanos temos de alguma maneira metendo os pés pelas mãos referente a algo que ao longo do tempo foi (e ainda é) um anseio de todos (sem medo de generalizar nesse caso), e que para Aristóteles é o que precisamente nos diferencia dos animais: a linguagem, isto é, a capacidade de comunicação lógica e racional. Quero dizer que para cada ser humano, mesmo que de maneira subjetiva, é de vital importância para sua existência comunicar a quem quer que seja, sua forma de ver o mundo, sua maneira de perceber os fatos. Trocando em miúdos, todo ser humano anseia por expor seu ponto de vista sobre tudo que vê ou vivencia.

Acontece que ao longo do tempo isso ocorria de maneira restrita, ou seja, sua opinião sobre qualquer coisa se restringia a no máximo seu círculo familiar e/ou de amizade, quer dizer, tinha um alcance limitado, deixando cada indivíduo numa posição passiva diante de assuntos que diziam respeito ao âmbito nacional, por exemplo. Quero dizer que qualquer fato que ocorresse no Brasil, chegava até os indivíduos por meio dos veículos de comunicação em massa (rádio e televisão) e uma vez tendo recebido a notícia sobre qualquer fato, tentava opinar sobre ele, e ficava extremamente restrito, limitando-se a dar sua opinião a familiares e amigos.

Porém a internet, sobretudo as redes sociais mudou tudo isso, possibilitando a cada indivíduo ser um sujeito ativo no processo de comunicação, dando a possibilidade de dar uma maior abrangência às suas opiniões, um maior alcance ao seu anseio de opinar sobre o que quer que seja. Isso pra mim é muito positivo, mas ao mesmo tempo extremamente preocupante, nos deixando no limiar da contradição, uma vez que se analisarmos o desenrolar de tudo isso, perceberemos que ao longo do tempo algumas empresas de telecomunicações eram preponderantes nesse quesito, podemos citar a Rede Globo de Televisão por exemplo, que durante anos deteve a primazia das informações no país, e nós éramos meros receptores das notícias, e essas informações eram recebidas e tratadas (principalmente as que vinham dos programas jornalísticos da mesma) como uma verdade incontestável.

Ironicamente, hoje assistimos a parcela conservadora da sociedade chamar essa rede de tv de "Globo lixo". Aí entra o cerne da questão da contradição que aqui discuto, pois lembro bem de diversas manifestações das quais fiz parte dentro dos movimentos sociais, movimento estudantil, ativismo cultural, onde sempre fomos às ruas denunciar os desmandos dos governos, anteriores (governo Lula e Dilma), e essa mesma emissora criminalizava, descredibilizava, taxava como baderna, e esses movimento a denunciavam como manipuladora que falseava a verdade, e curiosamente essa parcela da sociedade defensores "da moral e dos bons costumes", defendia como verdade tudo aquilo que esse tal grupo de tv noticiava. Era a verdade. Entretanto, agora assistimos o contrário, vemos essas mesmas pessoas nos darem razão sem admitir, porém vemos que o motivo de hoje atacarem a Rede Globo, como sempre fizemos e denunciamos, diz respeito a seus interesses ligados ao grupo político que hoje administra o país. (Coloco em primeira pessoa por ter vivenciado tudo isso nas ruas, nos movimentos sociais e culturais dos quais fiz parte).

Essa contradição fica mais escancarada se analisarmos as redes sociais, onde se nota uma série de pessoas emitindo suas opiniões baseadas muitas vezes em memes ou grupos de WhatsApp, ou até mesmo em algum site de notícias, como se fossem especialistas em assuntos que exigem no mínimo alguns anos de estudos. Tal fato leva a uma reflexão ainda mais profunda, pois com essa enxurrada de informações que nos chegam diariamente, não sabendo quais delas correspondem de fato à verdade, gera uma preocupação: a verdade hoje, existe? Uma vez que com essa gama de informações e notícias, a gente acaba subsidiando qualquer ponto de vista. Ou seja, atualmente existem diversos canais de informações disponíveis, principalmente sites que corrobora qualquer ponto de vista, por mais estapafúrdia que seja. A título de exemplo cito o atual estágio do Brasil em meio a essa pandemia do Covid 19. Uma dúzia de sites, vídeos e etc afirmam que o número de mortes oficiais não condiz com a realidade, pois existem governantes obrigando as equipes médicas a atestarem as causas da morte como decorrente do coronavírus, mesmo sendo outras. Por outro lado, uma dúzia de sites, vídeos e etc, afirmam que o número de mortes em decorrência do vírus é muito maior, pois o que está ocorrendo é que os governantes estão obrigando os médicos a atribuírem outras causas de morte ao invés de assumirem que é por conta do vírus.

Sendo assim, a pergunta é: existe uma verdade, existe uma realidade? Tendo em vista que existem subsídios teóricos para fundamentar qualquer ponto de vista, cabe a nós escolhermos aquele que satisfaz ou nosso ego, ou nosso ser. Deve-se considerar que isso não é algo novo na humanidade, sempre houve ao longo do tempo fundamento para vários tipos de ideias totalmente opostas, porém em outros tempos não havia internet, ou ao menos ela não tinha se popularizado como hoje. Para ilustrar cito um exemplo clássico dentro de muitos, a rusga intelectual entre Pierre Joseph Proudhon e Karl Marx, se no período você quisesse ser contra o socialismo/comunismo teria que ler Filosofia da Miséria de Proudhon (considerado anarquista anos depois), obra na qual o referido autor aponta as contradições do sistema proposto por Marx. Em contrapartida se quisesse apoiar o socialismo, leria Miséria da filosofia, obra na qual Marx coloca as fraquezas e contradições nas ideias de Proudhon e defende as suas, ou seja, se poderia escolher em qual "verdade" acreditar e ter um fundamento teórico a seu favor. Atualmente ocorre o mesmo, a diferença consiste no modus operandi, já que a leitura de uma obra dá muito mais profundidade e fundamento do que a leitura de um texto num site ou um vídeo no youtube.

Diante do exposto, qual seria a resposta para a pergunta? Eu particularmente acredito que sim, existem verdades e realidade! Não se pode relativizar tudo, os pontos de vista não alteram os fatos em si. Os fatos são os fatos! Porém como geralmente não temos acesso aos mesmos, acabamos ficando com as versões dele e tentando nos posicionar a partir disso, o que se configura como uma tarefa no mínimo, complexa. Contudo a possibilidade de opinar sobre qualquer coisa, comunicar a visão de mundo de cada um, desde que não se cometa nenhum crime para com outrem, deve ser abraçada e defendida por todos, uma vez que a condição de livres pensadores é intrínseca ao seres humanos, porém é algo que deve ser conquistada, vencendo principalmente a acomodação, como diz a sabedoria antiga das idades: "a verdade por si, fala". Desde que tais posicionamentos visem o bem da coletividade, objetivem a evolução dos seres humanos, eles têm valor, devem ser respeitados e defendidos.


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